Bruce Dean Willis

is Professor of Spanish and Comparative Literature at The University of Tulsa. His research and publications focus on diverse aspects of poetry and performance, and expressions of Indigenous and African cultures, in Latin American literature, particularly Brazil, Chile, and Mexico.

TIME FOR CHOCOLATE is available for purchase through One Act Play Depot! A brief description:

An intoxicating evening of music, poetry, and chocolate... in pre-conquest Mexico!
Based on a fifteenth-century dialogue among nobles schooled in rhetoric and philosophy, the play pits father against son in a war of words over the power and beauty of artistic expression.

Thursday, June 25, 2009

Esboços do Nu Modernista

O nu literário às vezes retrata-se num contexto natural, favorável aos objetivos da filosofia naturista. O seguinte são idéias referentes a alguns exemplos do nu natural num contexto especificamente brasileiro: o modernismo. Oswald de Andrade, por exemplo, contextualiza o nu com versos “digeridos” dos colonizadores portugueses. Eis o “erro de português”:

Quando o português chegou
Debaixo duma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português

Já no começo do modernismo, no esforço de revalorizar a autêntica cultura brasileira, Oswald apontou para o aspecto positivo do nu, porém um nu potencial, não realizado no desigual intercâmbio das tradições. Nestes versos o clima parece ser o único fator decisivo na luta da roupa, mas como sabemos, na realidade a religião e os costumes europeus foram as causas da abolição da prática indígena de andar despido. Em mais um poema, “as meninas da gare,” Oswald volta a este momento inicial de contato entre culturas para desenvolver o efeito da nudez natural dos indígenas sobre os europeus. Os versos, ironicamente traspostos da Carta de Pero Vaz de Caminha (de 1500) a um cenário urbano moderno, cuestionam jocosamente o preconceito importado da vergonha:

Eram tres ou quatro moças bem moças e bem gentis
Com cabelos mui pretos pelas espadoas
E suas vergonhas tão altas e tão saradinhas
Que de nós as muito bem olharmos
Não tinhamos nenhuma vergonha

As “vergonhas” expostas aqui curiosamente negam, dentro dos mesmos versos, a possibilidade da “vergonha” católica na que foram criados os colonizadores. Desajeitavelmente não foi possível a inteira erradicação deste conceito do pecado original, mesmo que alguns poucos europeus adotaram o estilo naturista dos povos autóctonos. Tanto na poesia do Oswald quanto nos seus manifestos “Pau-Brasil” e “Antropofagia,” a nudez forma parte da cosmovisão indígena revalorizada pelos autores e artistas do movimento modernista.


Mário de Andrade também utiliza o nu natural, de uma maneira que afirma o caráter pluricultural do povo brasileiro. Na sua rapsódia Macunaíma, o protagonista (que quase não fala) e os dois irmãos dele saem do banho que tomaram na marca do pezão de São Tomé, transformados nos fenótipos característicos do país: branco, vermelho e negro: “E estava lindíssimo na Sol da lapa os três manos um louro um vermelho outro negro, de pé bem erguidos e nus. Todos os seres do mato espiavam assombrados.” Altamente representativa da origem natural do país, a fauna indígena aparece numa lista que faz Mário de nomes e variedades das espécies e dos ruidos que faz cada uma. Os animais “assombrados” começam a fazer barulho até que Macunaíma “botou as mãos nas ancas e gritou pra natureza: ─Nunca viu não! Então os seres naturais debandaram vivendo e os três manos seguiram caminho outra vez.” É somente depois deste bautismo (que é também metamorfose e renascimento) acompanhado pelos irmãos nus, fenotipicamente diversos, e acompanhado também pela “fala” natural dos animais do mato, que Macunaíma vai começar falar com verdadeiro sotaque e vocabulário brasileiros. Nesta cena, e também na exagerada cerimônia macumbeira num capítulo posterior, a nudez é condição imprescindível para a aproximação à essência puramente brasileira.


De maneira semelhante, as famosas imagens de Tarsila do Amaral, como A Negra e Abaporu, realçam a importância que deram os modernistas ao nu como expressão autêntica. Nestas imagens e outras semelhantes, o corpo é muitas vezes exagerado, favorecendo certa parte deformada, num intento de estender, de esse jeito emblemático, os limites da representação corpórea do país. O corpo nu foi para os modernistas um conceito atávico, ideal para encarnar a liberdade artística da criação duma nova e orgulhosa identidade nacional.

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